sábado, 14 de maio de 2011

O que nos faz humanos?

Ao olharmos para o nosso planeta, damos conta da sua singularidade no espaço cósmico. Vivemos no único planeta em que há vida. Não discuto aqui a possibilidade de existir vida em outro lado do Universo, mas até agora isso é uma mera hipótese.

Há vida aqui na Terra, por milhares de anos, se é que o tempo é linear e corre sempre igual [1]. Existiram muitas formas de vida, que apareceram e desapareceram. Darwin, propôs que toda a vida não passa de múltiplas faces de uma primeira centelha, que aconteceu num passado remoto. A religião diz que essa centelha foi divina. Os evolucionistas dizem que foi uma probabilidade. Por isso, na maior parte a religião considera a evolução um anátema, porque reduz Deus a uma probabilidade estatística, retira-lhe personalidade. A maioria das religiões fundamentalistas luta contra a teoria da evolução. A Igreja Católica aceitou a teoria como compatível com a fé cristã [2]. Passou a interpretar o relato de Génesis como uma etiologia, uma tentativa de explicar a causa da existência da vida. Contudo o debate entre os que aceitam o método científico e os que seguem os seus dogmas religiosos, continua, numa espécie de diálogo de surdos.

É visível assim que responder à questão “O que nos faz humanos?” não é fácil. As dificuldades começam logo na origem do Homem. Somos afinal uma longa cadeia de acontecimentos evolucionários ou resultado de uma entidade inteligente?

Somos o único mamífero bípede[3] e o nosso cérebro é grande, embora para efeitos de inteligência isso não seja significativo. Mas não é o bipedismo nem a inteligência que nos faz humanos ou será? Etologistas, que estudam o comportamento animal, reconhecem comportamento inteligente em outras espécies, e reconhecem também capacidades e características que estávamos habituados a considerar como um exclusivo nosso [4].

Portanto, não sabemos sequer se outras espécies não se colocam as mesmas interrogações que colocamos a nós mesmos: Qual o sentido da vida? De onde viemos e para onde vamos? Nem mesmo sabemos se o sentimento religioso que nos acompanhou desde os tempos das cavernas até agora, não existirá sobre outras formas nas outras espécies. O que é claro, é que desaparecem com rapidez as barreiras que nos separavam e parece cada vez mais haver um contínuo de vida entre as diversas espécies.

Daí que a questão seja tão premente: O que nos faz humanos?
O homem religioso dirá provavelmente coisas como: Só o homem possui uma alma. Contudo nem todas as religiões acreditam que o homem tenha uma alma. Talvez digam então que só o homem tem uma relação com Deus. Embora não possamos saber se as outras espécies têm ou não um Deus, temos de nos perguntar: Com qual Deus? Afinal só entre as denominações ditas cristãs, os conceitos sobre Deus, variam imensamente! Uns acreditam que Jesus é Deus, outros que faz parte de uma Trindade e outros acham que é apenas filho de Deus. Não vale pena portanto considerar sequer religiões com outros candidatos a Deus ou Deuses.

Sendo que não há consenso relativamente às nossas origens, ou até mesmo à nossa relação com Deus ou Deuses, haverá algo que nos una? Fará sentido buscar o sentido da vida, quando ela é tão breve? Que sentido terá acumular conhecimento, se esse conhecimento apenas se traduzir numa infinita angústia? [5] Não terá mais sentido usufruir a vida, buscar a felicidade?

Alguns argumentam que se deve consagrar o direito à felicidade, como um direito básico. De facto, se o conhecimento é o caminho interminável, a procura da felicidade pode ser um caminho aprazível. E quando finalmente esta aventura de existir terminar, terá valido a pena, argumentam. Para o Homem religioso estes pensamentos são hedonistas e absolutamente condenáveis. A felicidade do Homem é alcançada pela sua relação com Deus que a mais das vezes implica a negação da sua própria vontade e dos seus desejos. Contudo, no Sermão do Monte, Jesus apenas falou da felicidade humana. E que sentido teria uma relação com Deus, se não se traduzisse numa promessa de felicidade plena no futuro? Afinal a religião é apenas um hedonismo [6] adiado.
E se a busca da felicidade é o que faz de nós humanos, então a pergunta que de seguida se torna mais premente é: “O que nos faz realmente felizes?”

[1] Einstein assegura que não, num referencial acelerado o tempo decorre mais devagar.

[2] http://br.reuters.com/article/worldNews/idBRN1641023720080916

[3] Outros mamíferos têm deslocação bípede, mas esta é ocasional ou como no caso dos cangurus e afins é saltitante.

[4] Recomendo a leitura dos livros de Jonathan Balcombe, “Second Nature” e “Pleasurable Kingdom”.

[5] A Bíblia diz em Eclesiastes 1:18: “muita sabedoria, muito desgosto; quanto mais conhecimento, mais sofrimento”.(CNBB)

[6] O termo pode incluir sentidos muito diversos relativamente a como o prazer ou a felicidade pode ser alcançada.

1 comentário:

  1. Olá, Pedro! Como deve calcular, discordo dessa ideia de que o conhecimento nos faz infelizes! Se não soubéssemos acerca da medicina e de doenças, como iríamos curar pessoas? Se não soubéssemos acerca do que é preciso para construir uma casa, continuaríamos a viver ao relento!

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