As religiões são diversas também naquilo que consideram como essencial, como o núcleo duro, o cerne, a pedra de toque da sua essência. Uns consideram que é a prática, outros a sua doutrina, outros a forma como edificam o individuo, outros o ritual. Mesmo entre as religiões que dizem seguir a Cristo, esta variedade na essência é notória. Assim alguns acham que a Escritura sendo importante, não é o mais importante, porque a Escritura embora essencial, chega-nos pela interpretação dos devotos, dos santos. Assim a Escritura e a tradição são o caminho. Outros procuram mais as emoções, os sentimentos, numa espécie de comunhão com Deus, mais pessoal e menos literata, donde as Escrituras são o menos importante, pois é a experiência pessoal o mais importante. Há aqui certamente algum contato com o gnosticismo, mas reduzir simplesmente assim, não capta a realidade.
Qual é o melhor?
Alguns dizem que o mais importante é a Verdade. Talvez até se respaldem nas palavras das Escrituras atribuídas ao próprio Cristo quando disse a Pilatos: “Para isso nasci e para isso vim ao mundo, a fim de dar testemunho da verdade.” [1].
Portanto alguns acham que não há nada mais importante do que a Verdade. Também acham que esta verdade se encontra nas Escrituras porque estas são a Palavra de Deus! [2]
Mas esta paixão pela Verdade como essência do cristianismo é eivada de escolhos e problemas. Curiosamente esta apetência pela verdade, estas palavras do Cristo em especial, apenas encontraram eco no evangelho de João, o mais tardio a ser escrito, o mais filosófico, talvez afinal o mais afastado do próprio Cristo.
O que era importante para Cristo?
Alguma verdade doutrinária? Seria difícil, pois de alguma forma ele reescreveu a verdade ao reinterpretar as Escrituras Hebraicas. Isso é claramente visível na sua interpretação sobre o cumprimento do Sábado. Em termos doutrinais não se pode esquecer que uma das causas do exílio judaico em Babilônia foi o não cumprimento do sábado pelos israelitas! No pós-exílio judeus zelosos vão cumprir escrupulosamente o sábado; afinal aprenderam a lição!
Mas este zelo religioso bateu algumas vezes na falta de misericórdia! Por isso Jesus bate num ponto essencial ao afirmar: “O sábado veio à existência por causa do homem, e não o homem por causa do sábado;” [3]
Portanto resta a interrogação: O que é mais importante? Alguns insistirão que a Verdade é importante. Não estou tão convencido que esse seja o ponto central do cristianismo. Os judeus não se preocuparam muito com dogmatismos, encarando a Verdade, como um processo dinâmico e dialético. Acho que têm razão.
Mas creio que o Cristo disse o que era mais importante. A Verdade essencial para Ele e mais importante era o homem!
E o que é importante para o homem? Para que precisamos de
Deus afinal? Tudo o que fazemos mesmo quando não acertamos, é uma tentativa,
para sermos felizes. Sim, a felicidade do Homem é realmente o essencial. Se não
o fosse, porque teria o Cristo feito um discurso inteiro apenas falando sobre o
que nos pode fazer felizes? [4]. Essa felicidade humana conforme se depreende
da continuação do sermão do monte, só é alcançável pela prática, pela
realização do bem sem olhar a quem, o que implica incluir até os inimigos [5] e
sempre de uma forma pró-ativa [6].
Todo o sermão do monte é um manual de como ser feliz, de evitar as armadilhas
que nos podem retirar desse caminho e cheio de conselhos práticos para o
alcançar.
[1] João 18:37
[2] João 17:17
[3] Marcos 32:27
[4] Mateus cap. 5, 6 e 7
[5] Mateus 5:44
[6] Mateus 7:12